terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Música Sustentável


Este texto escrevi para a revista REAÇÃO NATURAL que saiu agora em Janeiro de 2009:
¨Tem coisas que me deixam mal humorada. E uma das principais é o desinteresse, que é o que leva à ignorância. E pior: quando a pessoa tem à sua disposição a informação...o descaso.
Vou tentar transcrever um diálogo entre mim e um amigo músico, que trabalha numa loja de instrumentos musicais. Ele me pediu todo empolgado para assistir uma matéria gravada com ele para um programa de TV, falando sobre guitarras. E eu, achando que ele ainda ia gravar, disse:
-Poxa, que legal! Aproveita para falar sobre as guitarras de madeira certificada!
Ele: Sobre o quê??? Não conheço este tipo de guitarras.
Eu: São as guitarras com certificado de madeira reflorestada.

Ele: Ah, Alana, não entendo nada sobre esse tipo de madeira. Até porque dizem os ¨puristas¨ que as melhores são feitas com mogno...

Eu: (!!!) ...Tudo bem!!Você pode preferir Mogno, Cedro, Marfim, Marupá...A madeira reflorestada nada mais é do que a madeira que você conhece só que com o selo que serve para o consumidor reconhecer que o produto que ele está comprando não degrada o meio ambiente, assegura manutenção da floresta e combate a ilegalidade. Isto é: elas são exploradas mas replantadas.As guitarras têm a mesma qualidade e timbre que uma não certificada. A diferença é a sua atitude.

Ele: Ô, Alana...tenho certeza que lá em Londres, a dona de casa que compra um móvel, está destruindo muito mais o planeta do que uma simples guitarra.

Eu: Só que eu acho que uma dona-de-casa em Londres que compra uma cadeira de balanço,não influencia todo um povo como um Sting, um Bob Dylan, Bono, Madonna.
Estes, além de uma guitarra nas mãos, têm um microfone à boca.

Ele: É verdade...mas agora também não importa. Porque eu já gravei a matéria. E vai ao ar amanhã.
Eu: ...

É...realmente não importa. Sendo assim, nem contei a ele sobre as milhares de mortes que acontecem ¨na surdina¨ devido ao tráfico da exploração do preferido mogno dos tais¨puristas¨. Não contei a ele sobre a morte de dezenas de espécies de animais que não conseguem se adaptar à nova realidade florestal. Não contei a ele sobre Chico Mendes. Até porque ele deve conhecer vários ¨Chicos¨ já.

Mas talvez pudesse ter dito que eu sei que comprar um instrumento com o selo do FSC * emitido pelo Conselho Brasileiro de Manejo Florestal , é apenas um primeiro passo, uma mudança de comportamento. Que o que se vê é um total descaso , não só dele, e, quando há fiscalização, essa recai sobre a população mais pobre. O IBAMA, o órgão do governo a quem cabe a fiscalização, tem hoje menos de 200 homens nessa função na Amazônia.

Mas vou falar que já no Brasil alguns fabricantes de instrumentos como a Odery e a Hering já estão caminhando para o a fórmula ecologicamente correta, se utilizando de madeiras de áreas de manejo sustentável.

É isso aí. Quero finalizar dizendo que a guitarra que uso é pink, leve ,tem um timbre incrível e sim, é certificada. E que saber que minha música não está prejudicando ninguém pode ser uma grande besteira pra alguns. Pra mim, me faz fazer música melhor. Faz meu coração ficar em paz pra fazer mais músicas. Música sustentável. Música consciente.

**( sigla em inglês que significa Conselho de Manejo Florestal, um órgão credenciado mundialmente que checa a ¨cadeia de custódia¨ da madeira, ou seja ,o caminho que ela faz desde a floresta até o varejo, de acordo com uma série de indicadores sociais e ambientais)¨

A quem me lê e me ouve,

Um beijo,

ALANA.

2 comentários:

  1. Semelhante à devastação das matas e florestas, à poluição das águas dos rios e dos oceanos, à destruição da camada de ozônio, à acumulação desmedida de lixo orgânico, plástico, tóxico e atômico, semelhante à deterioração das relações humanas, rurais e urbanas, a música do mundo globalizado está feia, tóxica, suja e é cada vez mais prejudicial à saúde de todos os seres vivos do planeta.
    No século XX, a música ocidental foi destituída de seus poderes e valores mágicos, místicos, curadores, harmonizadores e criativos, em troca de uma cultura elétrica massificante, entupidora de mentes e arrombadora de ouvidos, voltada para a produção e comercialização de objetos sem sentido, sem coração e sem espírito.
    O consumo de música eletronicamente modificada paga, além de direitos autorais às gravadoras, royalties pela marca de cada equipamento empregado na gravação/degravação/audição, depende de energia produzida à custa da natureza, hidrelétricas e usinas atômicas principalmente. Todo este equipamento que hoje produz música eletrônica, dentro de no máximo dez anos terá virado lixo plástico. Esta música é prejudicial à saúde e à natureza do planeta, mesmo sem entrarmos na questão da impressionante quantidade de lixo cultural produzido aos bilhões e fartamente difundido via mídia eletrônica por todo o planeta.
    Para ser sustentável e ecologicamente correta, a música precisa ser feita sem equipamentos eletrônicos. Isto deveria ser óbvio, mas não parece passar pela mente de ninguém. Nunca ouvi alguém falar ou escrever sobre isto a não ser eu mesmo. Uma rápida pesquisa na internet vai confirmar: são raras as iniciativas e escassas as idéias relacionando música e ecologia ou música e sustentabilidade. Encontramos várias letras de canções gravadas com discurso ecológico, um estúdio londrino que utiliza energia solar, reclamações contra a emissão de CO² nos megaespetáculos do U2, mais esta sua defesa calorosa da utilização de madeira certificada na fabricação de guitarras elétricas. Há uma Orquestra Vegetal austríaca que toca instrumentos feitos com cenouras e nabos e, segundo a matéria, o grupo já tem dois cds gravados e “faz um som muito estranho, que parece uma mistura de jazz e música eletrônica”. Ou seja, não temos uma visão clara sobre o que seja sustentabilidade em relação à música.
    Para ler mais sobre este assunto: http://caoguimaraes.webs.com/osolmaior.htm

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  2. Show de matéria, Alana! Bom seria que no Brasil existissem mais músicos com esta conscientização! Há no Brasil, um luthier de harpas que utiliza sim, madeiras com selo de certificação e eu sou endorser desta marca! Um abraço, e manifeste-se mais vezes!
    Cely Rodrigues
    Música Com Harpa
    www.celyrodrigues.com

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